Blog Um Ano no Topo do Rio Grande
Comer carniça é uma tarefa para poucos, e não fossem estes poucos, teríamos sérios problemas de contaminação no ambiente. Uma carcaça de qualquer animal que morre no campo ou na mata, é prontamente localizada e a festa inicia. Os negros carniceiros chegam em bandos e limpam o cadáver de suas carnes e visceras em poucos minutos. São os lixeiros da natureza.
De grande porte, o urubu-de-cabeça-preta é o mais abundante na região, seguido do urubu-de-cabeça-vermelha e do raro e imponente urubu-rei, que ainda não consegui registrar. Vive em bandos de mais de dez indivíduos aproveitando as correntes quentes que sobem pelas paredes do cânion para ficarem planando e recorrendo cada metro do local em busca de carniça.
O acasalamento desta espécie já iniciou aqui no Monte Negro, como mostra o registro que fiz no dia 7 de agosto. Os ninho, geralmente com um único filhote, são feitos nos paredões em alguma depressão da encosta ou em pequenas cavernas naturias decorrentes de deslizamentos.
Os graxains são pequenos câes nativos da América do Sul ocorrendo no Rio Grande do Sul apenas duas espécies, o graxaim-do-campo e o graxaim-do-mato. No norte do Brasil é conhecido como lobinho e tem um tamanho de um cachorro médio. Habitam tocas que podem estar no campo ou nas matas, dependendo da espécie e da ocorrência de locais para estes abrigos. Na região do Monte Negro existe o graxaim-do-campo e é uma espécie relativamente abundante.
Um casal de graxains-do-campo caçando no campo aberto, próximo a um açude. A fêmea é a da direita e o macho, provavelmente, o outro. Consigo afirmar por que presenciei a fêmea na posição de urinar típica dos canídeos, agachada nas duas patas posteriores. Este registro foi feito próximo da estrada que sai da Pousada Monte Negro em direção a São José dos Ausentes. .
Este graxai-do-campo é um macho e estava caçando só, em uma outra área em outro dia, diferente da foto anterior. Sei que é um macho porque ao urinar, levantou apenas uma perna, como fazem os cães. Fez diversas marcações de território enquanto caçava. Este registro foi feito muito próximo da borda do cânion da Coxilha, que fica ao sul do Monte Negro.
Após 25 dias de atividade de campo com observações, fotos e descrição das paisagens e suas características, encerrei a parte de campo do inverno. Agora vem a fase de compilação dos dados e seleção de fotos e decrições do que foi visto e registrado. A fauna de inveno foi registrada em seus ambientes naturais e pude ter ideia daquels animias que são residentes ali o ano todo. A partir da próxima etapa dos trabalhos de campo, na primavera, começarei a registrar aqueles animais que são migratórios e vem para a região para a temporada de reprodução.
Cenáro típico do inverno aqui em Ausentes: campo dourado contrastando com a mata sempre verde de araucárias e o amanhecer com neblina densa depositada nas partes baixas dos vales.
A cerração é bastante frequente no inverno daqui, cobrindo tudo de forma a transformar o cenário em uma monocromia de tons de cinza, criando quadros espetaculares.
Registrar a fauna de mamíferos durante o dia é uma tarefa árdua e que exige, além de uma boa dose de sorte, a calma e o equipamento na mão para o registro. Este graxaim-do-campo eu fotografei antes de ser visto por ele e consegui algumas boas fotos antes de sua fuga.
O frio é uma constante ppor aqui, não só no inverno, mas principalmente nesta estção. As geadas banqueiam campos, casas, estada e tudo o mais que estiver ao desabrigo.
O inverno aqui na região do Monte Negro é bastante severo e o frio de cortar e doer os ossos. Quando venta, o resultado é ainda pior e tudo fica difícil. Registrar uma foto exige certo malabarismo e paciência. Tirar as luvas e lidar com os dedos duros para manejar a máquina torna difícil e dolorido fazer um registro, mas não perco uma oportunidade. Bem agasalhado, cabeça coberta e tentando desviar dos topos de morro, sigo na busca dos melhores momentos do inverno por aqui.
A cerração, branca e rápida, chega sem muito aviso e nesta época abrevia bastante os trabalhos de campo. Turistas frustrados aguardam, muitas vezes em vão, "abrir" o cânion para uma visualização e muitas fotos. A visão fica restrita e a hora é de se recolher, acender um fogo em casa e trabalhar nas imagens e textos do projeto Um ano no topo do Rio Grande, que se avolumam a cada dia e trazem muitas coisas interessantes.
O pior que pode acontecer é ser pego pela cerração quando se está num cânion. Nesta foto acima, fui surpreendido no cânion da Coxilha, local novo para mim e para não ser apanhado em pleno campo, tive que ser rápido e voltar a base antes de ser engolido pela onda branca que avançou sobre o campo implacável. O tempo fechou e a cerração só levantou no dia seguinte. Os perigos tem que ser conhecidos e respeitados.
Quando não tem cerração, pode ter uma trégua e um sol aparecer para colorir tudo, dando vida ao campo que se apresenta com os capins mortos. Mas, do nada, o tempo muda e pode vir uma chuva normal ou uma de granizo, como a da foto acima. Pedras pequenas e evento de curta duração, mas suficiente para mostrar o humor do clima por aqui. Mas nada disso atrapalha ou impede o trabalho, uma vez que é para isso mesmo que estou aqui: ver e registrar a natureza em todas as suas manifestações ao longo das quatro estações do ano. Comecei pela mais severa, para não achar que o trabalho seria fácil.
São Jose dos Ausentes é terra de muitos contrastes e de muitas marcas recordes, tanto de maioro altitude como de menores temperaturas no inverno. Também no inverno se observa a mudança brusca na coloração dos campos, passando de dourado a negro, em segundos. É o efeito das queimadas anuais, uma prática secular não só daqui, mas de toda a região dos campos de cima daa serra.
Geadas muito fortes em madrugadas sem nuvens, levantam-se em colunas de cristais de gelo criando um cenário surreal.
O fogo rouba a cor dourada dos campos e prepara o terreno para as novas pastagens de primavera e verão que se anunciam.
Depois do fogo passar, reina o peto, o silêncio e o cheiro acre de cinzas. Cercas resistem, com alguns pedaços queimados, destacam-se algumas rochas, ocultas anteriormente pela vegetação, mostrando o campo nú.
Hoje retornei a Ausentes e estou instalado na Estãncia Tio Tonho, com todo o carinho e simpatia dos proprietários. Na vinda me deparei com a indefectível paisagem de meio para o final do inverno: o fogo dançando seguindo a música do vento e os campos negros que ficam.
Na rápida passagem do fogo, estala a grama seca, fogem os insetos, enterram-se outros, levanta a densa fumaça e pouco depois reina o império do negro.
Os bichos andam sobre as cinzas em busca de uns talos tenros que não existem. Este evento anual garante a renovação das pastagem para o início da primavera, período que se aproxima rápido.
Chegando perto da estância, tive a grata oportunidade de encontrar um casal de graxains do campo, perto da estrada tranquilos, buscando alguma sobra de alimento em um depósito de esterco de curral. O que não serve para uns, sempre servirá para outros.
No início de agosto estaremos retornando para a região do Monte Negro para completar a etapa do inverno, da expedição Um ano no topo do Rio Grande. Registros do estado natural das plantas e animai, as cores do inverno e rigor do frio serão captados e transformados em publicações na página do jornal Nova Época, de Canela, nas próximas três sextas feiras. Acompanhe e participe deste trabalho, tanto com sugestões como com apoio.
A geada, marca registrada do inverno, este ano veio forte e cedo. Este registro foi feito no dia 20 de junho, início do inverno, prenunciando muito frio, o que vem se confirmando.
O contraste do branco do frio, o amarelo queimado do campo e o verde das araucárias e a escuridão efêmera das sombras dão o tom do inverno aqui em Ausentes, na região do Monte Negro.