Blog Um Ano no Topo do Rio Grande

O caldeirão do topo do Rio Grande

Como uma caldeira efervescente, o cânion Monte Negro mostra a energia do litoral que vem espiar o planalto. A cerração vem conferir o visual daqui de cima e, muitas vezes, se encanta e chama a turma toda. Aí só ela desfruta, já que a visibilidade cai a quase zero. 

 

O caldeirão do cânion joga para o alto, além da cerração, nuvens carregadas que se tranformam em rápidos e intensos aguaceiros de verão. Tudo contribui para a beleza do cenário, que por si só, já é um diferencial. 

Encantos de um final de tarde primaveril

Os dias nesta primavera já são bem mais longos do que aqueles do inverno. O sol, nesta data (29 de setembro), já nasce as 6:01h e se põem as 18:20h, tendo já o dia pouco mais de doze horas de luz. Tanto no início como no seu final, o dia encanta pela sua luz alaranjada e pelos quadros que são pintados no céu, com as garatujas feitas pelas nuvens que são coloridas pelo sol ao se despedir.

 

 

O sol, pouco antes do ocaso, pinta de vermelho e alaranjado a atmosfera, compondo com as coxilhas de Ausentes, um cenário típico de uma aquarela.  

 

Quando se esconde o sol, as luzes azuis aparecem no cenário dando um colorido cambiente, azulando os campos. 

 

Fim do dia, céu colorido ainda pelo estertor do sol, e o negro toma conta das coxilhas, mergulhando matas e campos no escuro da lua minguante.  

O fogo que queima mas não mata

A queimada de campo é polêmica e gera discussões antagônicas, ásperas e quase passionais, tendo de uma lado os proprietários de campos e de outro os ambientalistas e as leis que regem a matéria. Ando por aqui vendo e registrando a natureza e seus ciclos, e a queimada é um deles. Fogo rápido, fogo pequeno, fogo grande tocado a vento, fogo que lambe a borda das matas, fogo que apaga nos banhados e outros tantos que se constata. Agora, no início da primavera, vejo aqueles campos que foram queimados no final do inverno e registro o seu novo desenvolvimento e vejo muitas espécies de plantas que foram calcinadas, rebrotarem com um vigor impressionante. Bem ou mal, o fogo é uma realidade e a renovação também.

 

Xaxim-do-campo que foi totalmente queimado (suas folhas) rebrota nesta primavera. O caule é resistente ao fogo e as gemas das folhas novas ficam protegidas do calor. 

 

A gunera, ou urtigão, a planta com a maior folha que há, é típica desta região de cânions do planalto. Após uma queimada severa do inverno, verifiquei um rebrotamento intenso, já que a parte do caule fica protegina no solo e é resistente ao fogo. 

Começou a primavera.

O início da primavera mostra muitas alterações aqui na região do Topo do Rio Grande, em São José dos Ausentes. Os campos que foram queimados no inverno, já se mostram verdes, incipiente ainda, mas já com brotação visível. As aves já criam seus filhotes e outras fazem ninhos, as andorinhas já estão revoando os céus daqui atrás dos insetos e filhotes de veados campeiros já foram encontrados. As flores começam colorir matas e campos quebrando a monocromia do inverno. É a primaveera chegando, com seus dias mais longos, quentes e ventosos. 

 

O início da primavera amanheceu limpo, frio, com alguma geada e neblina nas partes baixas do vale do rio do Marco, 

 

Já é possível ver a grama nova brotando após as queimadas do inverno, mudando a cor do campo de dourado para o verde novo. 

 

Os curicacas estão fazendo ninho no beiral do galpão da Estãncia Tio Tonho, reunindo gravetos e se acomodando num lugar improvável, instável e pouco convencional. Mas o importante é criar a nova geração. 

Rochas, estas duras testemunhas do tempo.

Rochas são as manifestações sólidas do que há no interior do planeta, das lavas incandescentes que um dia foram expulsas através de algum vulcão e que, ao se solidificarem, transformaram-se em duras e resistentes testemunhas do seu tempo. O sol, a chuva, o vento e os agentes biológicos tentam de tudo para desgastá-las, fazendo com que seus farelos se transformem em solos, mas algumas resistem, altivas e arrogantes, impondo-se na paisagem desafiando o tempo e as intempéries. 

 

Resistindo ao campo, algumas rochas são colonizadas por bromélias, musgos e líquens, transformando-se em jardins naturias no meio dos campos do topo do Rio Grande, em São José dos ausentes. 

 

Próximo ao cânion Monte Negro, rochas de grande dureza resistem ao abrasamento das intempérias, parecendo sentinelas de um tempo passado, cuidando do campo e de olho no litoral. 

 

Afloramentos de rochas próximo ao cânion da Coxilha, desafiando a gravidade, o tempo e a erosão. 

A cerração que encanta e espanta.

Muito comum no inverno, e até mesmo nas outras estações do ano, é a chegada repentina do fantasma branco que emerge sem aviso do fundo dos cânions da região do Monte Negro. Trata-se da conhecida, temida e admirada cerração. Formada pelas corentes mais quentes que sobem pelos paredões do cânion, chega mandando. Cobre tudo e esconde a paisagem aos olhos de qualquer vivente. Parece até que tem ciúmes das belezas cênicas formadas pelo conjunto dos campos dourados, vales verdes e matas densas de um tom verde escuro incomum. Ela chega retirando a visibilidade e vai molhando tudo no caminho, fato de que se aproveitam musgos, líquens e tantas epífitas que aqui habitam. Esta é a cerração, que como falei, encanta e espanta.

 

Do nada, sem aviso e sem ruído, surge das cavernosas dobras e paredões do vale do cânion da Coxilha, o fantasma branco espantando e escondendo até os urubus. 

 

 

O cenário vai sumindo e poucas formas resistem ainda por um tempo no visual da paisagem. Logo a monocromia assume o pincel e deixa tudo igual.  

 

Quando ela cobre tudo, destacam-se os galhos sem folhas da vimeira da Estância Tio Tonho que, na sua tristeza do inverno, sabe que logo suas folhas novas contemplarão o fenômeno local.

Final de dia

Aqui no topo do rio Grande, em São José dos Ausentes, o dia termina com uma sinfonia de sons, cantos, berros e gritos da fauna. Parece que todos anunciam que o breu da noite está chegando e, com ela, o repouso. Sabiás emitem sons curtos e graves parecendo "tucs" "tucs" como se fosse o sinal para se recolherem. As corucacas se agitam em seu último voo dos campos para os poleiros de alguma araucária, não sem antes "conversarem" animadamente nos poleiros, transformando os galhos dos pinheiros em verdadeirso galinheiros. Os terneiros berram para avisar as vacas que a fome de leite está grande. Fumaça nas chaminés das casas da Estância Tio Tonho anunciam noite fria e negra, de uma lua nova que parece que foge do frio do Monte Negro.

 

O dia termina como se fosse um espetáculo de cores e formas, mudando tão rápido quanto o vento. 

 

 

AS corucacas procuram os pinheiros ou os telhados das casas da Estãncia Tio Tonho para passarem a noite. 

 

 

Final do dia na Estância tio Tonho: pouca luz, muitos pinheiros e um campo de inverno amarelo e triste. 

logo retangular

Atenção:
É proibida a reprodução, total ou parcial, dos conteúdos e/ou fotos, sem prévia autorização do autor.