Uma capela no morro
Vista da Capela num final de tarde. Pousado na cruz, um falcão quiri-quiri, alheio a história, procura suas presas.
Igrejas e capelas existem em praticamente todas as cidades, vilas e povoados deste Rio Grande do Sul, atestando a fé de um povo e a implantação de uma cultura religiosa que aqui se consolidou juntamente com a colonização. Cada rincão tem sua capela ou igrejinha, cada cidade tem suas igrejas ou catedrais, sempre próximas dos centros mais movimentados. Aqui no Vale do Rio Silveira não é diferente, abrigando uma comunidade com forte tradição religiosa que cultua suas casas de orações com muita devoção e dedicação. Mas tem uma capela que escapa a esta regra, localizando-se no alto de um morro aqui na Vila do Silveira, distante da vila e erigida em terras de propriedade de Francisco Boeira, descendente de um dos pioneiros que colonizaram esta região. Nas suas palavras... “A Capela é uma homenagem que procurei fazer aos meus ancestrais e a todos quantos - indígenas, jesuítas, portugueses, escravos, tropeiros ou agregados - viveram ou transitaram ao longo dos séculos por aquelas paragens em que se localiza a fazenda”.
Detalhe da capela
Esta capela é única, tanto pelo seu local onde foi erigida – o topo de um morro que permite uma vista espetacular para qualquer lado que se olhe, quanto pela sua arquitetura ou seu afastamento de um centro urbano. Paredes de vidro e a simplicidade de ter ali o essencial: uma cruz, bancos, o silêncio e a possiblidade de, além de rezar e meditar, contemplara a natureza em volta. Não tenho o hábito de frequentar igrejas pelo simples motivo de que a minha catedral é a natureza, seja em que rincão eu estiver, mas confesso que ela me chamou muito a atenção. Não pelo fato de ser um templo religioso apenas, mas pelo conjunto formado pela arquitetura enxuta e sintética, o que tirou aquele ar sério e sombrio das igrejas convencionais, e pelo esplendor do entorno, mostrando que pode sim ser feito um certo arranjo onde natureza e igreja se completam.
Vale do Rio do Marco, tendo ao fundo a formação da cerração vinda das entranhas do cânion Monte Negro, logo a frente.
Junto desta capela foi construído um pequeno cemitério para a família Boeira, tendo ali um mausoléu onde se encontram os restos dos ancestrais da família. O local exige uma subida forte, a partir da sede da propriedade onde também se localizam os museus, mas vale qualquer esforço para se chegar até ali. Uma vez no topo do morro, abre-se uma vista para o leste mostrando os meandros do vale do Rio do Marco, um dos afluentes do Rio Silveira, com toda a beleza das encostas forradas de campo nativo e matas de araucárias, além do aproveitamento das baixadas com lavouras e pastagens. Melhor hora para se estar ali é à tardinha, quando a luz deixa o vale mais dourado e permite uma observação mais detalhada das coisas. Ainda é possível, dependendo do dia, apreciar dali um por de sol espetacular tendo a Vila do Silveira logo abaixo. Vale cada passo até o topo, cada minuto passado lá e cada inspirada daquele ar puro carregado de histórias, sem falar na calma e na possibilidade de se fazer uma boa reflexão ou introspecção sobre qualquer assunto que seja trazido pelo vento, ou pela memória.
Pequeno cemitério da Família Boeira, ao lado da capela.