Blog Vale do Rio Silveira

Desenhos na água

Em muitas das minhas caminhadas pelo rio Silveira tenho visto, em algumas curvas ou remansos, depósitos de uma espuma branca que fica dançando ao sabor da corrente e parece prisioneira do local, conformada com a impossibilidade de fugir dali. Esta espuma, formada pelo movimento próprio da água e da matéria orgânica nela existente, vai se acumulando e circulando criando verdadeiras pinturas abstratas dignas de um momento de atenção, ou de um quadro. A cada minuto tudo muda e novas criações são apresentadas, com novos traços e imagens espetaculares que surgem e se desmancham em segundos, desafiando o observador a ver ali um significado, uma imagem, uma paisagem. Fico olhando e montando mil desenhos de coisas e até de gentes que se formam e se deformam em quimeras irreconhecíveis.

Isso é apenas a minha observação de um fenômeno natural de quando o rio está mais baixo e encontra remansos onde a água anda em círculos para desviar obstáculos da topografia do leito. Semelhante ao movimento de nuvens, esta espuma que baila na água cria sombras no fundo raso do rio, semelhante e em outra escala, ao que vejo naqueles dias em que se formam nuvens pequenas que se agitam e correm pelo azul do céu parecendo fugirem de alguma coisa. Estas sombras projetadas podem servir de abrigo a algumas espécies de pequenos peixes e crustáceos que vivem nestes locais, iludindo o olhar de garças e socós que gostam de pescar ali. Quando aumenta o volume do rio, esta espuma é arrancada de seu calmo remanso e mandada rio abaixo, desmanchando-se em mil partes até encontrar outra paragem assim que a fúria da água se acalmar. Lentamente ela vai se reagrupando e reinicia a compor novos quadros, novas figuras e formas para encantar outros observadores ou criar sombras de mil formas no fundo do leito para proteger os peixes.

Um rio tem mais coisas do que água corrente, pedras, limos, peixes e crustáceos. Ele tem elegância no deslizar sobre o leito, fúria ao se encher e carregar tudo por diante, esplendor ao se atirar nos degraus do leito formando cachoeiras e cascatas. Ele tem também um dom artístico e aproveita a tinta das espumas dos remansos para pintar quadros efêmeros de uma beleza singela e disponíveis a alguns observadores que conseguem ver a arte em lugares incomuns.

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