Serrarias de araucárias
Remanescentes de araucárias nas margens do Rio Silveira
Tenho visto, aqui pelo Vale do Rio Silveira, muitas matas de araucárias com exemplares novos, com 30, 40 ou 50 anos de idade, aproximadamente, espalhados aleatoriamente formando maciços muito interessantes. Falo nesta idade pelo fato de que, até o início da década de 1980, a exploração madeireira era permitida e havia dezenas de serrarias espalhadas por toda a região, não só daqui, mas em todos os rincões onde houvesse pinheiros. No início da década de 1980, devido a esta superexploração, os órgãos federais criaram leis proibindo o corte das araucárias, numa tentativa de evitar seu extermínio. Assim, aquelas matas outrora exploradas ficaram abandonadas, as serrarias formam desmontadas, os trabalhadores migraram para vilas e cidades próximas. Queimadas de campo foram também restritas por leis ambientais, o que abriu a porta para o pinus ser plantado em grande escala em áreas de campos nativos. Como a necessidade de madeira só cresce, estes pinus suprem hoje uma demanda sempre crescente desta matéria prima.
Rasgos nos campos que se dirigem para as matas são hoje uns dos últimos e perenes testemunhos daquele tempo de exploração. São as cicatrizes das antigas estradas cortadas para escoar as madeiras ou toras para as serrarias, e daí para os centros consumidores. É relativamente fácil de andar por estas antigas vias dentro das matas, hoje muito erodidas e com vegetação que toma conta do leito mostrando diversos graus de recuperação. Ando por algumas delas e fico imaginando a passagem de tratores e juntas de bois puxando toras recém cortadas e ainda vertendo o âmbar dourado, ou resina, bem típica destes pinheiros. Pareço ouvir a voz de comando dos condutores dos bois, forçando-os ao limite de suas forças, e as toras de pinho abrindo sulcos no solo, parecendo que, mesmo depois de abatidas, negam-se a saírem dali criando toda a espécie de dificuldade aos serradores. Serviço bruto.
Maciço de araucárias perto da Pousada Potreirinhos
Ainda encontro alguns depósitos naturais de nós de pinho no solo, alguns semienterrados e outros descobertos pela erosão. É outro indício daquela época, quando a abundância da madeira era tanta, que se desprezava a ponta dos pinheiros, ficando aquelas galhadas jogadas parecendo aranhas gigantes, prostradas no solo aguardando os decompositores. Os nós de pinho, por serem mais duros e dotados de resina, eram preteridos pelos fungos e insetos comedores de madeira e assim resistem até hoje nas matas. Estou escrevendo esta crônica aqui na Pousada Potreirinhos em um dia de chuva e frio, em frente a uma lareira abastecida com nó de pinho de algum pinheiro que, muito provavelmente, tenha sido cortado naquela época. Há história em tudo, basta ver.
Restos de um tempo, juntamente com as estradas riscadas no campo, estas marcas ficam para contar a história passada por aqui, que pode não ter sido das mais interessantes sob o ponto de vista ambiental. Época de muita atividade humana onde vilas surgiram para dar suporte a homens e mulheres que se dedicavam a um extrativismo sem regras e sem limites, desencadeando o freio legal que sustou a atividade para bem da preservação de uma espécie. Poucas marcas ficaram daquela época, e alguém que desconheça o passado, pode circular por estas matas sem desconfiar do passado recente que assistiu a uma investida sem precedentes contra umas das espécies mais emblemáticas do nosso sul do Brasil – a araucária.