Blog Andando por Aí
O chimarrão
Mateando, ao amanhecer, no Morro dos Gaiteiros
Tomar um chimarrão bem cevado pela manhã, ou no final da tarde, é um hábito que quase todos os gaúchos cultivam. Ele agrega as pessoas e cria laços atávicos com a terra natal e sua cultura, estejam os mateadores longe ou perto do pago. A erva-mate, planta utilizada para preparar a bebida, era há muito conhecida pelos índios guaranis, quando da chegada dos europeus. Nativa da América do Sul, foi batizada cientificamente de Ilex paraguaiensis por um naturalista francês chamado Auguste de Saint-Hilaire, em 1820, durante uma viagem que empreendeu ao sul do Brasil, quando teve contato com a planta ainda desconhecida pela ciência. Ele passou pelo nosso Estado em 1823 e seu livro “Viagem ao Rio Grande do Sul”, com todo o roteiro e os incríveis relatos da vida na época, é um clássico da literatura de viagens científicas.
Foi fácil e rápido, aos espanhóis e portugueses, incorporar o hábito de tomar esta infusão e assim, lentamente, estabeleceu-se uma das primeiras agroindústrias ervateiras comandada principalmente pelos Jesuítas na região missioneira. Foram eles que desenvolveram técnicas para o cultivo comercial desta preciosa planta e descobriram, entre outras coisas, que nos primeiros anos de cultivo as mudas deveria permanecer à sombra. Outro truque foi o da quebra da dormência das sementes, que faziam dando os frutos maduros para as galinhas e depois coletavam as sementes nos seus excrementos. O estômago mecânico destas aves domésticas, a moela, agia como uma lixa sobre as duras cascas das sementes, deixando-as prontas para a germinar.
O fruto da erva-mate
A maioria das pessoas, que tem o hábito de matear, não conhece a árvore que produz a infusão e isso constatei quando trabalhava no Parque do Caracol. Lá, tem vários exemplares desta árvore e eu observava o espanto das pessoas quando liam a placa que as identificavam. A primeira reação das pessoas era de arrancar uma folha, esmagá-la entre os dedos e cheirar. Como a folha verde não exala o cheiro de mate, ao contrário da folha desidratada e socada, algumas duvidavam da veracidade da informação contida na placa.
A folha da erva-mate
Outro dado interessante é que esta espécie tem sexos separados. Isso mesmo. Existem árvores com flores masculinas e árvores com flores femininas e só estas produzem frutos. Este fruto tem um gosto semelhante ao da fruta do café e é muito procurado pela fauna, como o sabiá-laranjeira, sanhaçu-cinzento, pombas e outras aves. Ao ingerirem, acabam dispersando as sementes através dos excrementos e isto faz com que ela colonize novas áreas.
Mateando na Estância Tio Tonho, ao amanhecer
Esta infusão quente é um grande legado cultural, que devemos aos índios guaranis e à natureza, tão importante que a erva-mate foi eleita a árvore símbolo do Rio Grande do Sul e, o chimarrão, a bebida. Sabiás e sanhaçus não tomam mate mas plantam a árvore, sem o saber, e por isso acho que devemos, a eles também, um saludo especial.